Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
19 de Abril de 2024
    Adicione tópicos

    A empregabilidade seletiva impõe qualificação obreira ao cumprimento das metas estabelecidas

    Mais uma sentença da juíza do trabalho, Dra. Cláudia Reina, da 5ª Vara do Trabalho de Niterói, enfrentando a temática violência moral nas relações laborais, onde o modelo econômico exige do candidato ao emprego abnegação e aptidão ao cumprimento das metas estabelecidas, por aumento da produtividade e lucratividade.

    Trata-se de sentença condenando o CINTIBANK SA a pagar à reclamante, sua empregada, além de outras verbas de natureza trabalhista, indenização reparatória por dano moral reconhecido e resultante, segundo a prova produzida nos autos, de abuso por despedidas ilegais ocorridas por não atingimento das metas estabelecidas.

    Leia a íntegra da sentença.

    5ª VARA DO TRABALHO DE NITERÓI

    ATA DE AUDIÊNCIA

    “Encontra-se largamente difundida a idéia de que paira sobre o nosso país uma ameaça de derrocada econômica (...). Numa conjetura social que apresenta muitos pontos em comum com uma situação de guerra (...). É em nome dessa “justa causa” que se utilizam, larga manu, no mundo do trabalho, métodos cruéis contra nossos concidadãos, a fim de excluir o que não estão aptos a combater nessa guerra (os velhos e doentes que perderam a agilidade, os jovens mal preparados, os vacilantes. (...) Os que estão aptos para o combate, exigem-se desempenhos sempre superiores em termos de produtividade, de disponibilidade, de disciplina e abnegação. Essa guerra travada sem recurso às armas implica no entanto sacrifícios individuais consentidos pelas pessoas e sacrifícios coletivos decididos em altas instâncias (...). Nessa guerra, o fundamental não é o equipamento militar ou o manejo das armas, mas o desenvolvimento da competitividade. Em nome dessa guerra - da qual não se diz que seja santa, embora às vezes se cochiche que é uma “guerra sã”- admite-se atropelar certos princípios. O fim justifica os meios (...) A questão central é por que uns consentem em padecer sofrimento, enquanto outros consentem em infligir sofrimento aos primeiros?

    (Cristophe Dejours - A Banalização da Injustiça Social)

    Aos 28 dias do mês de maio de 2009, às 16 horas, reuniu-se a 5ª VARA DO TRABALHO DE NITERÓI em sua sede e sob a presidência da MM. Juíza do Trabalho Dra. CLAUDIA REGINA REINA PINHEIRO para JULGAMENTO da Reclamação Trabalhista proposta por THAIS COSTAL ALIANO em face do BANCO CINTIBANK SA.

    Aberta a audiência foram de ordem da MM Juíza Presidente, apregoadas as partes ausentes.

    Prejudicada a tentativa final de conciliação.

    SENTENÇA

    THAIS COSTAL ALIANO, qualificada à folha 02, ajuíza ação trabalhista em face do BANCO CINTIBANK SA. Sustenta que trabalhava em longa jornada, bem como que as cobranças eram rigorosas. Afirma que quando não alcançadas as metas pré-determinadas, o empregado era humilhado na frente dos colegas de trabalho. Além disso, sustenta que houve demissões pelo simples fato de metas não terem sido obtidas. Afirma que tal situação gerou sérios problemas de ordem moral e que precisou buscar auxilio psicológico. Requer pelos fatos e fundamentos expostos na exordial, as seguintes parcelas: horas extras e reflexos, indenização por danos morais decorrente de assédio moral (fls. 15/16)

    Emenda à petição inicial às fls. 40/60

    Conciliação inicial rejeitada.

    Contestação da Ré às fls.40/70 argüindo a prescrição parcial, requerendo a improcedência dos pedidos, tendo em vista os fatos impeditivos, extintivos e modificativos que sustenta. Juntou documentos -fls. 88/98.

    Na audiência de instrução foi colhido depoimento pessoal da autora. Ouvidas as testemunhas indicadas pelas partes (fls. 619/626).

    Sem mais provas a produzir, foi encerrada a instrução processual.

    Produziram as partes razões finais em memoriais, permanecendo inconciliáveis.

    Recebidos os autos do processo (01 volume) em 20/05/2009 e entregues em 29/05/2009 para imediata publicação da sentença.

    Relatados, vistos e examinados.

    II - FUNDAMENTAÇÃO

    1) PRESCRIÇÃO PARCIAL

    A autora foi contratada em 08/1/2004. A rescisão contratual ocorreu em 09/06/2006. A ação foi proposta em 09/06/2008. Portanto, afasto a prescrição extintiva e parcial na forma do artigo 7º, inciso XXIX da CFRB/88.

    2) ASSÉDIO MORAL - PRESSÃO PSICOLÓGICA - CONSTRANGIMENTO - ATENTADO À DIGNIDADE HUMANA NO CUMPRIMENTO DE METAS.

    Requer a reclamante indenização por danos morais em razão de ter sofrido assédio moral. Sustenta tratamento vexatório na cobrança de metas. Alega que no intuito de cumprir as metas estabelecidas pela agência era submetida a tratamento constrangedor. Aduz abalo psicológico por causa de pressão psicológica sofrida em razão das metas estabelecidas sem critérios, o que levou ao pedido de demissão e tratamento psicológico.

    A reclamada contesta longamente alegando ausência de qualquer culpa. Nega tratamento vexatório. Alega que não pode ser responsabilizada.

    A instrução probatória comprovou que a meta estabelecida pela instituição bancária estava acima do limite do razoável.

    Conforme leciona o reconhecido psiquiatra e professor francês Cristopher Dejours, princípios têm sido descartados em nome da brutal competitividade, produtividade, globalização e neoliberalismo para atender as leis de marcado. É preciso vencer concorrentes. A guerra alegada por Dejours decorre de um cálculo e uma estratégia. A guerra “s㔠tem origem no mercado, no sistema econômico, na globalização e nas condutas humanas. (A Banalização da Injustiça Social)

    Concluo que o assédio moral estratégico decorre em parte desta “gera sã”, pois visa maior obtenção de produtividade para atender as leis de mercado, ao sistema econômico, ao neoliberalismo e a globalização.

    O banco, inicialmente, exigia abertura de 40 contas por mês no importe médio de R$3.000,00 por conta aberta conforme declarado por um empregado do banco que depôs como testemunha (fl.116). Levando-se em conta 22 dias de trabalho, teríamos uma média de duas contas por dia. Na época em que autora laborou, a média era de 25/28 contas mensais, no mesmo importe pecuniário. Sendo assim, os empregados eram e são obrigados a abrir praticamente uma conta bancária por dia.

    Considerando a concorrência entre as instituições financeiras, bem como o baixo poder de aquisição do brasileiro, sabemos que não é fácil encontrar pessoas com rendas acima de R$ 3000,00 (três mil reais). Portanto, a exigência se torna absurda. O banco leva para os funcionários a responsabilidade ingrata na alta captação de clientes, bem como transfere para os empregados o risco do negócio da atividade empresarial, o que é vedado por lei. Considerando a média de 25 contas ao mês que devem ser abertas em 11 meses de trabalho, já debitando as férias, a autora tinha que abrir 275 contas ao ano com o valor mínimo de R$ 3.000,00 para cada uma. O banco réu pretende transformar seus empregados em máquina de fazer dinheiro e lucro.

    Na hipótese dos autos ficaram exaustivamente comprovados todos os fatos narrados na petição inicial. A testemunha indicada pela autora declarou:

    “Que o banco exige meta; que a reclamante tinha que abrir de 22 a 25 contas por mês, no valor de R$ 3.500,00 “para cima”; que a reclamada exercia pressão para o atingimento de metas; que presenciou na agência a reclamante ser destratada pelo Sr. Luiz Guilherme em razão de metas; que presenciou o supervisor Luiz Guilherme dizer à reclamante que ela deveria atingir determinado número de metas, sob pena de ficar fora do grupo; que tinham reuniões para cuidar das metas (...) que a depoente sentia pressão para atingimento de metas; que o referido supervisor falava, não apenas à reclamante, mas também para outros funcionários, palavras de baixo calão, tais como: vocês têm que mostrar trabalho, pois o salário está depositado em suas contas, ou então vão procurar outra coisa para fazer; que já viu o referido supervisor se exaltar, presenciando agressão verbal; que a reclamante trabalhava internamente; que presenciou a reclamante chorando, eis que a mesma tinha depressão por sentir¬-se coagida pelo supervisor (...) que se não batesse a meta, o supervisor agia da mesma forma com os demais empregados” (sic- fls. 112/113).

    A primeira testemunha indicada pelo Banco declarou:

    “Que mensalmente há cobrança da meta a ser atingida; que se o empregado não conseguisse atingir as metas determinadas, poderia ser mandado embora; que demanda muito esforço do empregado abrir 25 contas por mês, eis que não é fácil um público detentor de tal renda comprovada (...) que indicou uma psicóloga para a reclamante, enquanto essa exercia o cargo de gerente de relacionamento; que indicou a psicóloga à reclamante, eis que essa lhe disse que estava sendo muito pressionada; que existia um quadro com a produção individual exposto para todos; que tinham que passar para o supervisor as visitas realizadas diariamente” (sic- fls. 114/115).

    A segunda testemunha indicada pelo Banco informou:

    “Que não trabalhou com a reclamante; que quando o depoente começou no banco, há 6 anos, a meta era a abertura de 40 contas mensais, passando posteriormente para 25, e por fim, 21contas por mês, que na época em que era gerente de negócios; que na época o valor mínimo de renda bruta era de R$ 3.000,00, e tinham nichos que eram de R$ 2.000,00; que não trabalhavam menos de 8 horas” (fl.116)

    Conforme verificado a testemunha indicada pelo réu confessou que indicou uma psicóloga para a autora em razão da pressão sofrida.

    A produtividade exigida demonstra a pressão para obtenção de metas. O discurso da empresa é construído visando o mercado, a clientela, o lucro e a competitividade, o que faz empregar os conhecidos métodos de resultados. Não basta o empregado vender as mercadorias da instituição bancária, ele tem que vender-se no que diz respeito à sua saúde física e mental, por meio de longas jornadas de trabalho decorrente da pressão constante para atender as metas pré-determinadas.

    A cultura das metas, produtividade e resultados genéricos é extremamente perniciosa, pois sequer considera a individualidade do empregado como ser humano. Todos têm que atingir metas exigidas de forma genérica ou mesmo aleatórias. Não contratam mais seres humanos e sim números, observando-se que a maior crueldade ocorre quando o trabalhador é descartado por adoecer pelas próprias condições do ambiente degradante de trabalho.

    As diversas formas de cobrança de produtividade por meio da manipulação e pressão psicológica, tem levado tanto nas empresas privadas como no serviço público, a remanejamentos, rebaixamentos, marginalização, perseguições, desrespeitos, em completo atentado ao direito fundamental à dignidade humana, à saúde e à vida.

    A reestruturação produtiva, a organização do trabalho, os avanços tecnológicos visando maior produção e competitividade, a globalização e os novos modelos de gestão não podem e não devem expor o trabalhador de tal forma que possa atingir a sua dignidade, honra, imagem, privacidade e saúde. Não é custoso lembrar que o artigo 170 da CFRB determina que “a ordem econômica funda-se na valorização do trabalho”.

    A organização do trabalho não pode em razão da competitividade, reestruturação produtiva, para obtenção de enormes lucros, transformar o trabalhador em mero instrumento do empregador para utilizá-lo e pressioná-lo a seu bel-prazer, como se o obreiro não fosse um ser humano real, possuidor de sentimentos, direito à dignidade, honra, personalidade e à saúde física e mental. Nesse sentido, Ingo Wolgang Sarlet:

    “Convém não esquecer que, para Immanuel Kant - Fundamentos da Metafísica dos Costumes-, a pessoa humana constitui um fim em si mesma e, portanto, não pode ser empregada como simples meio da vontade própria e alheia. Assim, desde logo se verifica que na concepção de Kant (largamente incorporada ao pensamento filosófico, político, contemporâneo) a coisificação e instrumentalização da pessoa humana encontra-se vedada.” (Eficácia dos Direitos Fundamentais -2004).

    Portanto, o poder diretivo do empregador é limitado, uma vez que o direito fundamental à dignidade humana não permite instrumentalizar o profissional como se esse fosse uma coisa ou máquina de produzir em plena disposição da atividade empresarial. O assédio moral não é uma questão pequena, de pouco valor no âmbito empresarial, mas uma questão mundial.

    Segundo Marie-France Hirigoyen, os trabalhadores, vitimas do assédio moral, normalmente preenchem o seguinte perfil, observando-se que tal perfil não exclui outros: pessoas questionadoras e críticas da política de gestão e solidárias com o sofrimento alheio; trabalhadores que resistem ao abuso de poder; os doentes ou adoecidos do trabalho, bem como os que retornam da previdência com estabilidade e em pós - acidentes de trabalho; mulheres pós-parto e com filhos menores de 10 anos; empregados em final de estabilidade; maiores de 35 anos e os sindicalizados.

    Os assediadores podem ter as seguintes características que não excluem outras: chefes que servem à empresa de forma indiscriminada; pessoas que repassam ordens sem refletir, além de utilizar estratégias de sedução, cooptação e pequenas corrupções, mediadores das políticas de gestão e detentores de certa autoridade e aqueles que se utilizam de práticas autoritárias, amedrontam, intimidam, ameaçam e humilham, disseminando terror, maledicências, gerando um ambiente de instabilidade e desconfiança.

    O assédio moral é um grande risco para a saúde do trabalhador. A Vigilância em Saúde do Trabalhador deve estar atenta à esses novos riscos que podem ser fontes invisíveis e não mensuráveis pelos instrumentos tradicionais, mas nem por isso menos importantes ou graves, pois é sinal de instalação de processos de violência nos ambientes de trabalho, num grau de refinamento consentido pelos ditames do neoliberalismo e da reestruturação produtiva.

    Para Margarida Barreto, dentre as principais condutas que caracterizam assédio moral estão as seguintes: exigência acima ou abaixo da capacidade de cada um; intolerância com o cansaço do trabalhador; desqualificações públicas; críticas e atos que possam ridicularizar o empregado; imposição de horários fora da jornada com ameaças de desemprego aos resistentes e ameaça aos sindicalizados, dentre outras. (in Violência, saúde, trabalho - Uma Jornada de Humilhação) Marie-France Hirigoyen, emérita especialista no tema, define o assédio moral como “toda e qualquer conduta abusiva, manifestando-se, sobretudo por comportamentos, palavras, atos, gestos, escritos que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo seu emprego ou degradar o ambiente de trabalho”. (grifei - Assédio Moral: A violência perversa do cotidiano. 5ª edição. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil. 2002).

    O Assédio moral no ambiente de trabalho pode ocorrer pelo uso de técnicas de desestabilização empregadas de formas distintas, desde menções e sugestões maldosas que podem ser diretas ou indiretas quanto ao desempenho do profissional, bem como o descrédito e o preconceito em razão de determinadas situações específicas, como, por exemplo, quando o empregado adoece, sofre acidente do trabalho e doença profissional e passa a usufruir licença médica, benefício previdenciário ou quando retorna precisando ser readaptado em novas funções, uma vez que a crescente necessidade de produtividade e competitividade, muitas vezes, leva ao completo desrespeito ao direito fundamental à dignidade e à saúde do trabalhador.

    Tais atitudes reprováveis com aqueles que não conseguem atingir as metas impostas, e o tratamento humilhante muita vezes dado aos empregados ou servidores públicos adoecidos, acaba por tornar comum a marginalização do empregado ou do servidor público e “causam às pessoas sofrimentos, aflições e crises de que são testemunhas compulsórias os psiquiatras e assistentes sociais” (A banalização da Injustiça Social _Christopher Dejours)

    Na atualidade, o Poder Judiciário também tem sido testemunha constante de técnicas de desestabilização que não são derivadas de cegueira social, mas de estratégias muito bem calculadas para excluir aqueles que não se enquadram no perfil determinado. Como foi o caso da autora.

    Tais atitudes devem ser repudiadas pelo Poder Judiciário cujos membros têm o dever de aplicar as garantias constitucionais descritas na CFRB/88 e o dever de julgar tendo por base os Direitos Humanos e Fundamentais que norteiam todo o sistema jurídico.

    A CFRB/88 consagrou “a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa” dentre os princípios fundamentais da República Federativa do Brasil

    (artigo I, III e IV) além de erigir como garantia constitucional a liberdade no “exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendida as qualificações profissionais que a lei estabelecer” (artigo 5, XIII) e determina como fundamento da ordem econômica e financeira, a valorização do trabalho humano (artigo 170, caput).

    O artigo233 da Declaração Universal dos Direitos Humanos determina que toda pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, à condições eqüitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o desemprego.

    Não devem ser consideradas como condições satisfatórias de trabalho aquelas que são desenvolvidas constantemente por meio dos mais variados tipos de pressão psicológica, humilhações, injúrias, riscos à saúde psíquica e física, que leva ao sofrimento humano, para que o empregador possa garantir grande produtividade, competitividade e lucro.

    O assédio moral está ligado ao direito fundamental à dignidade humana, à imagem, à honra, à personalidade e à saúde do empregado, todos direitos fundamentais constitucionalizados introduzidos na Constituição Federal, bem como reconhecidos em diversos tratados e convenções internacionais adotadas pelo Brasil. O desrespeito aos referidos direitos comporta indenização por danos morais, pois tem aplicabilidade imediata (artigo 5, X, da CFRB/88).

    È inadmissível o menosprezo ao Direito Fundamental à vida, saúde, imagem, honra, privacidade e dignidade tanto do empregado de empresa privada como do servidor público. Todos direitos fundamentais constitucionalizados e que estão inseridos em diversos tratados internacionais.

    É preciso denunciar constantemente o abuso praticado por grandes grupos econômicos, empresas, instituições públicas e privadas.

    Em 24 de dezembro de 1888, Rudolf Von Ihering, já repudiava a condescendência, a resignação, a transigência e a indigna tolerância com a injustiça. Declarava:

    “Todos os Direitos da Humanidade foram conquistados na luta; todas as regras importantes do Direito devem ter sido na sua origem, arrancadas àquelas que a ela se opunham, e todo o direito, o direito de um povo ou direito de um particular, faz presumir que se esteja decidido a mantê-lo com firmeza. O Direito não é uma pura teoria, mas uma força viva (...) A manutenção da ordem jurídica, da parte do Estado não é senão uma luta incessante contra a anarquia que o ataca.” (A Luta pelo Direito).

    O pior é que essa violência pode se desenrolar sorrateiramente e silenciosamente ou por meio de palavras aparentemente inofensivas, mas que podem desequilibrar um ser humano levando o trabalhador a um estado de desconforto psíquico que pode evoluir para a irritação, estresse ou até destruí-lo em casos mais graves, como tentativa de suicídio onde, nesse caso, foi considerado como acidente de trabalho na França, na Espanha e em outros países. O assédio moral é capaz “de destruir um ser humano sem que haja uma gota de sangue sequer e sem qualquer gesto brutal contra ele, utilizando apenas o que se convencionou chamar de violência invisível, aniquilando moral e psiquicamente suas vítimas” (Ricardo Antonio Andreucci, professor e promotor de Justiça Criminal/SP, in A criminalização do Obviamente, tais atitudes nem sempre são facilmente perceptíveis para aqueles que sofrem e para aqueles que assistem. Muitas vezes, a violência está tão banalizada no cotidiano do trabalho que fica difícil perceber o que está acontecendo.

    Questiona-se o porquê de muitos aceitarem padecer em sofrimento. É uma questão de sobrevivência física. Com o imenso desemprego, salários baixos, flexibilização das garantias legais do trabalhador, a perda de espaço dos movimentos sindicais, falta de efetividade das leis, aliado à ditadura do poder econômico, acaba por aparentemente levar ao trabalhador a aceitação do sofrimento, por não crer em saída alguma. É preciso mostrar que existem meios eficazes para combater a violência contra o trabalhador. Por isso a importância da atuação do poder judiciário na efetividade dos direitos humanos e sociais.

    A Organização Internacional do Trabalho (OIT) tem denunciado a exposição dos trabalhadores de diferentes países a situações consideradas de violência moral no local de trabalho, inclusive, com pesquisas e levantamento de estatísticas.

    Em termos de legislação infraconstitucional, no âmbito federal já existem diversos projetos de lei federal sobre o assédio moral. O projeto de Lei 5.972/2001 altera o artigo 177 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, que dispõe sobre o Regime Jurídico dos Servidores Publicos Civis da União, das Autarquias e das Fundações Públicas Federais para acrescentar o inciso XX: “coagir moralmente subordinado, através de atos ou expressões reiteradas que tenham por objetivo atingir a sua dignidade ou criar condições de trabalho humilhantes ou degradantes, abusando da autoridade conferida pela posição hierárquica” (sic.).

    No âmbito estadual e municipal, muitos Estados e Municípios já contam com legislação sobre assédio moral.

    No exterior, países como França, Chile, Noruega, Uruguai, Portugal, Suíça, Suécia e Bélgica já possuem legislação e projetos de lei sobre o assédio moral.

    Transcrevo em parte a lei estadual nº 3921, de 23 de agosto de 2002 do Estado do Rio de Janeiro:

    Artigo 1º - Fica vedada, no âmbito dos órgãos, repartições ou entidades da administração centralizada, autarquias, fundações, empresas públicas ou sociedades de economia mista, do Poder Legislativo, Executivo ou Judiciário, inclusive concessionárias ou permissionárias de serviços estaduais de utilidade ou interesse público, o exercício de qualquer ato, atitude ou postura que se possa caracterizar como assédio moral no trabalho, por parte de superior hierárquico, contra funcionário, servidor ou empregado e que implique em violação da dignidade desse ou sujeitando-o a condições de trabalho humilhantes e degradantes.

    Artigo 2º - Considera-se assédio moral no trabalho, para os fins do que trata a presente Lei, a exposição do funcionário, servidor ou empregado a situação humilhante ou constrangedora, ou qualquer ação, ou palavra, gesto, praticada de modo repetitivo e prolongado, durante o expediente do órgão ou entidade, e, por agente, delegado, chefe ou supervisor hierárquico ou qualquer representante que, no exercício de suas funções, abusando da autoridade que lhe foi conferida, tenha por objetivo ou efeito atingir a auto-estima e a autodeterminação do subordinado, com danos ao ambiente de trabalho, aos serviços prestados ao público e ao próprio usuário, bem como, obstaculizar a evolução da carreira ou a estabilidade funcional do servidor constrangido. Parágrafo único - O assédio moral no trabalho, no âmbito da administração pública estadual e das entidades colaboradoras, caracteriza-se, também, nas relações funcionais escalões hierárquicos, pelas seguintes circunstâncias:

    I - determinar o cumprimento de atribuições estranhas ou atividades incompatíveis com o cargo do servidor ou em condições e prazos inexeqüíveis;

    II - designar para funções triviais, o exercente de funções técnicas, especializadas ou aquelas para as quais, de qualquer forma, sejam exigidos treinamento e conhecimento específico.

    III - apropriar-se do crédito de idéias, propostas, projetos ou de qualquer trabalho de outrem;

    IV - torturar psicologicamente, desprezar, ignorar ou humilhar o servidor, isolando-o de contatos com seus colegas e superiores hierárquicos ou com outras pessoas com as quais se relacione funcionalmente; V - sonegar de informações que sejam necessários ao desempenho das funções ou úteis à vida funcional do servidor; VI - divulgar rumores e comentários maliciosos, bem como críticas reiteradas, ou subestimar esforços, que atinjam a saúde mental do servidor; e

    VII - na exposição do servidor ou do funcionário a efeitos físicos ou mentais adversos, em prejuízo de seu desenvolvimento pessoal e profissional.

    Artigo 3º - Todo ato resultante de assédio moral no trabalho é nulo de pleno direito.

    Artigo 4º - O assédio moral no trabalho praticado por agente, que exerça função de autoridade, nos termos desta Lei, é infração grave e sujeitará o infrator às seguintes penalidades:

    I - advertência;

    II - suspensão; e/ou

    III - demissão;

    (...)

    Artigo5ºº - Por provocação da parte ofendida, ou de ofício pela autoridade que tiver conhecimento da prática de assédio moral no trabalho, será promovida sua imediata apuração, mediante sindicância ou processo administrativo.

    Parágrafo único - Nenhum servidor ou funcionário poderá sofrer qualquer espécie de constrangimento ou ser sancionado por ter testemunhado atitude definidas nesta

    No caso sub judice, a atitude da reclamada causou dano à dignidade, imagem, privacidade, honra e saúde da autora.

    Registro que o réu, na condição de empregador, é totalmente responsável pelos atos praticados pelo gerente, demais empregados e prepostos, em razão do disposto no artigo 932, III, do CCB/2002:

    ”Artigo 932 - São também responsáveis pela reparação civil:

    III_ o empregador ou comitente, por seus empregados, serviços e prepostos, no exercício do trabalho que lhe competir, ou em razão dele”

    • artigo 933 do Código Civil de 2002 determina que na hipótese acima indicada não mais se trata de responsabilidade subjetiva por culpa presumida , Portanto, a responsabilidade do empregador é sempre objetiva, ou pela ela presunção absoluta da “culpa in elegendo” ou “culpa in vigilando” conforme súmula 341 do STF ou em razão do disposto no artigo 933 do CCB/2002:

    Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.

    Súmula nº 341: É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto.

    Como já foi dito, restaram através do conjunto probatório comprovadas pressões inadmissíveis realizadas pelo Réu de tal forma a gerar ansiedade, angustia, medo, estresse, abalo psicológico, injúria, forte preocupação e imenso constrangimento sofrido pela autora.

    Ameaças de perda de emprego em um país onde o desemprego é uma constante, no mínimo, é um método perverso para obtenção de lucro e produtividade, podendo causar danos à saúde do trabalhador, constrangimento, medo, receio, atingindo frontalmente o direito fundamental à dignidade humana.

    A análise dos danos morais é de suma importância no Direito do Trabalho por ser esse um direito social espécie do gênero dos direitos humanos e fundamentais, não podendo ser desassociado do direito fundamental à dignidade humana. A existência da subordinação jurídica entre o empregado e o empregador, o estado de sujeição econômica do hipossuficiente, sendo esse a parte mais fraca da relação jurídica de emprego, deve levar o julgador a analisar se as determinações e ordens dadas pelo empregador ultrapassaram os limites do poder potestativo para atingir à honra, à imagem, à saúde e à dignidade do trabalhador, de tal sorte que a existência de lesão em tal sentido resulta obrigatoriamente numa reparação.

    A análise dos danos morais é de suma importância no Direito do Trabalho por ser esse um direito social espécie do gênero dos direitos humanos e fundamentais, não podendo ser desassociado do direito fundamental à dignidade humana. A existência da subordinação jurídica entre o empregado e o empregador, o estado de sujeição econômica do hipossuficiente, sendo esse a parte mais fraca da relação jurídica de emprego, deve levar o julgador a analisar se as determinações e ordens dadas pelo empregador ultrapassaram os limites do poder potestativo para atingir à honra, à imagem, à saúde e à dignidade do trabalhador, de tal sorte que a existência de lesão em tal sentido resulta obrigatoriamente numa reparação.

    Savatier caracteriza o dano moral como “qualquer sofrimento humano que não é causado por uma perda pecuniária”, e abrange todo atentado à reputação da vítima, à sua autoridade legítima, ao seu pudor, à sua segurança e tranqüilidade, ao seu amor próprio, à integridade de sua inteligência, a suas afeições... (Traité de la Responsabilité Civile, vol II, n. 05) Consoante Caio Mário da Silva “o fundamento da reparabilidade pelo dano moral está em que a par do patrimônio em sentido técnico, o indivíduo é titular de direitos integrantes de sua personalidade, não podendo conformar a ordem jurídica em que sejam impunemente atingidos” (Responsabilidade Civil - Forense, 5ª edição). Ressalva-se que o entendimento majoritário acerca da teoria da reparação dos danos morais, orienta-se no sentido de que a responsabilidade do causador do dano provém da violação (damnun in re ipsa). Portanto, verificada a ocorrência do evento causativo do dano, surge ipso facto, a necessidade e o dever de reparar a lesão sofrida. Como é sabido, vigora a orientação de que não há que se cogitar de prova, pois “não cabe ao lesado demonstrar que sofreu, realmente, o dano moral alegado. Assim, não precisa a mãe comprovar que sentiu a morte do filho; o agravado em sua honra não precisa demonstrar em juízo que sofreu a lesão” (Júlio Bernardo do Carmo, “O dano moral e sua reparação no âmbito do direito civil e do trabalho”, LTR, Vol. 60, III, pág. 295, 1996). Ë cabível acumular o pedido de dano moral e patrimonial oriundos do mesmo fato (Súmula 37 do STJ).

    Quanto à reparação pecuniária do dano moral, adoto o mesmo posicionamento de Caio Mário: “O problema de sua reparação deve ser posto em termos de que a reparação do dano moral, a par do caráter punitivo imposto ao agente, tem de assumir sentido compensatório. Sem a noção de equivalência que é própria da indenização por dano material, corresponderá à função compensatória pelo que tiver sofrido... A vítima de uma lesão a algum daqueles direitos sem cunho patrimonial efetivo, mas ofendida em um bem jurídico que em certos casos pode ser mesmo mais valioso do que o integrante do seu patrimônio deve receber uma soma que lhe compense a dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo juiz, atendendo às circunstancias de cada caso” (Responsabilidade Civil - Forense, 5ª edição). O valor fixado deve servir de desestímulo para novas agressões e impedir que o empregador pratique novamente os referidos atos com os demais empregados. O valor deve ter ainda o caráter pedagógico. Considerando o risco de saúde sofrido pela autora, a pressão psicológica exercida julgo procedente o pedido de indenização por danos morais, correspondente a R$ 100.000.00 conforme expressamente requerido (fls. 05 e 53) em face da gravidade e intensidade do sofrimento e a grande capacidade econômica do empregador.

    3) HORAS EXTRAS E REFLEXOS

    Requer a autora o pagamento de horas extras a partir da sexta hora diária ou sucessivamente horas extras a partir da oitava diária. Sustenta que não usufruía intervalo para refeição. Impugna os controles de jornada sob o fundamento que não revelam o real horário.

    A reclamada contesta a jornada declinada pelo autor na petição inicial não há como burlar tais marcações. Informa como funciona a marcação eletrônica. Sustenta que o autor exerce função compatível com 08 horas diárias na forma do artigo 224, parágrafo segundo, da CLT. Requer também a aplicação do artigo 62, I da CLT. .

    Para a caracterização da hipótese constante do inciso I do artigo 62 da CLT, com a finalidade de excluir do empregado o direito ao pagamento das horas extras laboradas, é necessário comprovar que não existia qualquer controle do empregador. Como leciona Valentim Carreou: “mesmo externo, se estiver subordinado a horário, deve receber horas extraordinárias (Maranhão, Direito do Trabalho, p.77). Também são devidas se a produção sendo mensurável, não puder ser realizada senão ultrapassando a jornada normal.” (Comentários à CLT).

    O preposto confirma que o que a autora tinha que trabalhar 08 horas diárias. Restou exaustivamente comprovado que a reclamante comparecia diariamente, o que demonstra que não existe liberdade de horário.

    Afasto a aplicação do artigo 62, I, da CLT pelos fundamentos acima expostos.

    Aplica-se o artigo art. 224, parágrafo 2º da CLT para os bancários que exercem algum tipo de atribuição que necessita da confiança direta do empregador Banco, tendo poderes restritos de mando, fiscalização e gestão ou não, mas exercendo atribuições de maior confiança dentro do quadro funcional existente no Banco empregador. Um único ato deste tipo de empregado pode ocasionar enormes prejuízos, mas não coloca em risco a atividade fim do empregador e a sua existência.

    Contudo, não basta o pagamento de gratificação de função para que o bancário seja inserido pela regra do artigo 224, parágrafo 2º, da CLT, e excluído da jornada reduzida de seis horas. Faz-se necessário que o empregador delegue a ele ao menos uma parcela de seu poder de mando e gestão, sem o que não ultrapassará o limite de mero repassador de ordens e tarefas para a qual a confiança exigida é a mesma que se verifica em qualquer relação de emprego. Impõe-se, portanto, que esteja comprovado o exercício efetivo de função de confiança, bem como a perfeita caracterização desta como tal, evidenciados os poderes, atribuições e responsabilidade que a distinguem.

    Na hipótese dos autos não ficou demonstrada a alegada função de confiança na forma do artigo 224, parágrafo 2º, da CLT.

    A autora apenas captava clientes para o banco. Não possuía qualquer liberdade. Não tinha funcionários subordinados como confessado pelo preposto. Conforme declarado pelas testemunhas indicadas pelo Banco, o gerente de contas tem a função de abrir contas captar e visitar clientes e o gerente de relacionamento tem por função atender clientes, bem como para abertura de contas precisava assinar em conjunto com o gerente geral e o supervisor.

    No caso, apenas a nomenclatura é referente ao cargo de gerente, mas não as atividades exercidas. A reclamante não detinha poder de mando, gestão e chefia, além de não possuir qualquer autonomia.

    A reclamante não recebeu gratificação pelo exercício de função de confiança, já que ausentes os pressupostos do

    artigo 224, parágrafo 2º, da CLT, com claro prejuízo, uma vez que não tinha as horas extras a partir da sexta diária remuneradas.

    • entendimento contido súmula nº 109/TST demonstra a impossibilidade jurídica de se reconhecer a função de confiança apenas pelo pagamento da gratificação. Assim sendo, a faz jus ao pagamento da sexta e oitava hora diárias.

    Não restou comprovada a ausência de intervalo para refeição, uma vez que a testemunha indicada não soube informar se autora usufruía. Contudo, restou comprovado o horário declinado na petição inicial, conforme depoimento prestado tanto pela testemunha indicada pela autora como pelo depoimento prestado pela segunda testemunha indicada pelo Banco (fls. 112 e 114).

    Para fins de cálculo, deverá ser considerada a seguinte jornada: 8.00 às 19:30 horas , sendo que uma vez por semana ingressa às 7.00 hora, com uma hora de intervalo para refeição de segunda a sexta-

    Assim sendo, são devidas horas extras laboradas a partir da 6ª diária, de segunda a sexta, observando-se o limite semanal de 30 horas e o divisor de 180, todas acrescidas do adicional normativo, observando-se as normas coletivas anexadas aos autos, respeitado os períodos de vigência e, na ausência, o percentual de 50% previsto na CFRB/88.

    Não se aplica a súmula 113 do C.TST, uma vez que as normas coletivas juntadas aos autos inclui os sábados e feriados no RSR do empregado bancário.

    Por habituais, defere-se a integração das horas acima deferidas ao salário para fins de projeção no 13º salários, gratificações, férias +1/3, FGTS + 40% e aviso prévio e DSR conforme normas coletivas em anexo, respeitando o período de vigência.

    O cálculo do valor das horas extras habituais, para efeito de reflexos em verbas trabalhistas, observará o número das horas efetivamente prestadas e sobre ele aplica-se o valor do salário-hora da época do pagamento daquelas verbas - En 347 do C.TST.

    4) DA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ

    Determina o artigo l4 do CPC:

    “Compete as partes e seus procuradores:

    I- expor os fatos em Juízo conforme a verdade;

    II- proceder em lealdade e boa-fé.

    III- Não formular pretensões, nem alegar defesa, ciente de que são destituídas de fundamento; IV- não produzir provas, nem praticar atos inúteis ou desnecessários á declaração ou defesa do direito. (Grifo nosso).

    O artigo 14 relaciona os deveres das partes, entre as quais, o dever de lealdade. Na realidade, os três primeiros incisos do mencionado artigo, são meras particularizações do dever geral de agir com lealdade.

    Nas palavras de Celso A. Barbi, o dever geral de agir com lealdade significa “obedecer às regras do jogo, no qual deve vencer aquele que realmente tem razão” (Comentários ao CPC, vol. I, Forense, 1991).

    Em razão dos artigos 14 a 17 do CPC, é plenamente aplicável ao sistema brasileiro, a notável lição de Liebman: “O processo civil com a sua estrutura contraditória em que a cada uma das partes se atribui a tarefa de sustentar as suas próprias razões, é essencialmente refratário a uma rigorosa disciplina moralista do comportamento daquelas. Se cada litigante pode contar, para vencer, apenas com a própria capacidade de explorar os elementos e os argumentos favoráveis, não se pode pretender que forneça também os que lhe são desfavoráveis e poderiam favorecer o adversário. Um dever nesse sentido não teria qualquer probalidade de ser observado e seu único resultado seria o de por em dificuldades e em situação embaraçosa a parte mais honesta.Mas é certo também que a habilidade e a perspicácia devem ter um freio, não podendo ultrapassar certos limites que os costumes e a moral social impõem e que para os defensores são representados pela exigência de ética profissional. é isso que quis dizer a lei, ao estabelecer o dever de lealdade e probidade.“

    No tocante aos defensores, por fim, em caso de violação do dever de lealdade e probidade o juiz deve comunicá-la às autoridades que exercem o poder disciplinar sobre eles”. (grifei Manual de Direito Processual Civil, Vol. I, 2ª edição, Forense, 1985).

    Verifica-se que a reclamada faltou com a verdade. O depoimento do preposto quanto às horas extras foi claramente inverídico.

    O réu alega que a autora tinha total liberdade de horário e que trabalhava o total de 08 diárias. A própria testemunha indicada pelo Banco demonstrou que podiam, sim, trabalhar 12 horas diárias ou mais (fls. 1122/113).

    Portanto, o réu não expôs os fatos em juízo conforme a verdade, agindo sem lealdade e boa-fé, formulando pretensões e alegando defesa, ciente de que são destituídas de fundamento, em profundo desacato as regras jurídicas e imperativas, contidas nos incisos I, II, III do artigo 14 do CPC.

    É necessário combater o uso de armas desleais, a manobras ardilosas tendentes a perturbar a formação do convencimento do órgão judicial.

    “Já não se pretende do Juiz que assista como espectador frio e distante, ao “duelo” das partes; ao contrário, dele se espera atividade eficiente no sentido de que a justiça seja feita. Para tanto, procura a Lei ministrar-lhe, entre outros, meios enérgicos de combate à má-fé, à improbidade, à chicana, em suas multiformas manifestações” (José Carlos Barbosa Moreira, em artigo intitulado “Responsabilidade das Partes por Dano Processual” - grifamos).

    Cabe ao Juiz, não apenas zelar como impor as partes o dever da veracidade e lealdade processual. As palavras do insigne Ministro Alfredo Buzaid, na Exposição de Motivo do Código de Processo Civil, demonstra claro o propósito de obrigar as partes a agir com honestidade e moralidade no curso de relação jurídica processual:

    “Posto que o processo civil seja, de sua índole, eminentemente dialético, é reprovável que as partes se sirvam dele, faltando o dever da verdade, agindo com deslealdade e empregando artifícios fraudulentos, porque tal conduta não se compadece com a dignidade de um instrumento que o Estado põe à disposição dos contendores para a atuação do direito e a realização de justiça”.

    Como ensina Hugo Alsina, é inadmissível que as partes pudessem impunemente faltar com a verdade. Portanto, a idéia fundamental, bem exposta por Carnelutti, é a de que hoje, a parte serve ao processo e não se serve do processo. Lealdade no jogo, portanto, é o que se procura atingir.

    Portanto, os magistrados devem coibir e afastar a litigância de má-fé e todo comportamento antiético que busca auferir benefícios através de procedimentos escusos, sob pena dos artigos 342 do CP e artigos 14, 15, 16, 17, 18, 31, 129, 133, I, 144, II, 147, 153, 199 e ss., 415 § único, 600 e 601 do CPC, tornarem-se letras mortas. Sem contar que o sentimento arraigado de impunibilidade, particularmente quanto à litigância de má-fé e crime de perjúrio, vem causando uma imagem negativa do poder judiciário aos olhos do jurisdicionado, uma vez que uma sentença prolatada tendo por base declarações falsas e fatos alterados intencionalmente para fraudar a legislação pátria, fere o principio da e segurança jurídica, além de poder ocasionar imensas injustiças, fazendo cair por terra a máxima “todo processo deve dar a cada um o que tem direito e precisamente aquilo que ele tem o direito de obter.”

    O processo é um instrumento posto à disposição das partes não somente para a eliminação dos conflitos, mas também para a pacificação geral na sociedade e para a atuação do direito. Diante dessas finalidades impõe-se a todos aqueles que participam do processo (partes, advogados, auxiliares da justiça, testemunhas, membros do poder judiciário e do ministério Público) os deveres de moralidade e probidade, que visam exatamente a conter os litigantes e a lhes impor uma conduta que possa levar o processo à consecução de seus objetivos. O desrespeito ao dever de lealdade processual traduz-se em ilícito processual, podendo dependendo do grau e dos atos praticados ser considerado até crime contra a administração da justiça, estes últimos regulados no Código Penal. Uma das preocupações fundamentais do CPC é a preservação do comportamento ético de todos aqueles que de alguma forma atuaram e participaram do processo (artigos 14, 15, 16, 17, 18, 31, 129, 133, I, 144, II, 147, 153, 199 e ss., 415 § único, 600, 601 do CPC).

    Conclui-se, portanto, que o Poder Judiciário com a colaboração do Ministério Público e OAB, deve coibir e punir qualquer artifício fraudulento, sob pena de causar sérias lesões ao principio do contraditório, do devido processo legal, da inadmissibilidade de obtenção de provas por meios ilícitos , todos direitos fundamentais e garantidos constitucionalmente (artigos 5º, XXXV, LV, LVI da CFRB/88), além de abalar a imagem do poder judiciário, de contribuir para o sentimento de impunibilidade, e de colocar em risco o próprio conceito de instrumentalidade do processo e jurisdição, considerada esta última uma longa manus da legislação, no sentido de que ela tem, entre outras finalidades, a de assegurar a prevalência do direito positivo do país, visando sempre a pacificação social e a segurança jurídica.

    É dever legal de o magistrado buscar a verdade, garantindo aos jurisdicionado uma prestação jurisdicional escorreita e justa e um Poder Judiciário forte, independente, imparcial e que preza pela segurança jurídica.

    Tendo sido contestada a alteração intencional de verdade dos fatos e a tentativa de induzir o Juízo a erro na imputação de falta grave, inverídica ao autor, condena-se a ré, de ofício, ao pagamento de indenização no percentual de 20% sobre o valor da causa em favor do reclamante além de honorários advocatícios no percentual de 20% no valor da condenação (artigo 18 do CPC).

    Defiro o beneficio da justiça, por preenchidos os requisitos legais.

    III - DISPOSITIVO

    Pelo Exposto, acolho a prescrição parcial suscitada para excluir da condenação os efeitos pecuniários das parcelas anteriores a 12/07/2001, visto que as lesões anteriores estão soterradas pela prescrição qüinqüenal prevista no artigo 7º, inciso XXIX da CFRB/88, e julgo PROCEDENTE EM PARTE para condenar o reclamado BANCO CINTIBANK SA pagar as parcelas abaixo apontadas conforme fundamentação supra que a este decisum passa a integrar.

    1) horas extras e reflexos,

    2) indenização por danos morais, correspondente a R$ 50.000.00 conforme requerido (fls. 05 e 53) em face da gravidade e intensidade do sofrimento e a grande capacidade econômica do empregador.

    Autorizada a dedução das parcelas pagas sob a mesma rubrica. Juros e correção monetária ex vi legis.

    .

    Confirmado o Decisum, deverá a parte Ré comprovar nos autos o recolhimento da cota previdenciária sobre as parcelas deferidas, nos termos da Lei 8.620/93 e Provimento 01/93 da Cog. Da Justiça do Trabalho, e tributária, na forma da Lei n. 8541/92. No procedimento executivo da cota previdenciária observar-se-á a Lei n. 10.035/2000, com base na declaração incidente sobre a natureza jurídica das parcelas deferidas, todas devidamente intituladas na motivação, por conseguinte, é desnecessária a discriminação per si, pois não se trata de condenação genérica. Ademais, incumbe ao terceiro interessado -INSS- pronunciar-se no momento oportuno. Juros e correção monetária, na forma da legislação vigente, considerando-se como época própria a que se tornou devida a parcela deferida, nos termos do artigo do Decreto-Lei 75/66 e do artigo 459, parágrafo único da CLT e súmula 381 do C.TST. DETERMINO o desconto e o recolhimento das contribuições previdenciárias devidas pela RECLAMANTE supracitada nos termos da legislação vigente, do provimento TST Cor. nº 03/2005, do ROCSS (Dec. 3.048/99), da ON MPAS/SPS n. 08 de 21.03.97 (DOU 11.04.97), da ON Conjunta INSS 66, de 10.10.97, publicada no DOU de 25.11.97 e observada a OS 205, de 10.03.99 (publicada no DOU de 24.03.99) e demais normas pertinentes, observado o teto, mediante comprovação nos autos do recolhimento ao INSS no prazo legal e fica CONDENADA a RECLAMADA, supramencionada, a recolher a sua quota-parte, mediante comprovação nos autos, no prazo legal, sob pena de execução, nos termos do parágrafo terceiro do artigo 114 da CF/88 c/c artigo 876, parágrafo único, da CLT. Descontos fiscais, na forma do artigo 46, parágrafo segundo da Lei 8.541/92, da Lei 7.713/88 e Prov. Correg. Geral da Justiça do Trabalho 03/2005 do artigo 28 da Lei 10.833/2003. Observe-se a da súmula 368 do C.TST quanto aos recolhimentos fiscais e previdenciários.

    Em razão das declarações prestadas pelos litigantes, testemunhas e documentos juntados, expeça-se oficio ao Ministério Público do Trabalho independente do trânsito em julgado, com cópia da ata de audiência (fls. 619.620.621,622, 623, 624, 625,626) e sentença de mérito para atestar se há ou não interesse público envolvido, e tomar todas as medidas que entender necessárias para verificar a extensão dos fatos narrados pelas partes na forma do artigo 83, XII, da Lei Complementar 75/93.

    A propositura de embargos declaratórios procrastinatórios ensejará a multa constante do artigo 538 do CPC

    Custas de R$ 2.000,00, calculadas sobre o valor de R$ 100.000,00, arbitrado para esse efeito, nos termos do artigo 789, § 3, alínea “c” da CLT, pelo réu.

    Intimem-se as partes.

    E, para constar, lavrou-se a presente ata que vai devidamente assinada, redigida, digitada e impressa por esta magistrada.

    CLÁUDIA REGINA REINA PINHEIRO

    JUÍZA DO TRABALHO

    (*) Luiz Salvador é Presidente da ABRAT (www.abrat.adv.br), Presidente da ALAL (www.alal.com.br), Representante Brasileiro no Depto. de Saúde do Trabalhador da JUTRA (www.jutra.org), assessor jurídico de entidades de trabalhadores, membro integrante Corpo de Jurados do TILS e do corpo técnico do Diap e Secretário Geral da CNDS do Conselho Federal da OAB, e-mail: luizsalv@terra.com.br, site: www.defesadotrabalhador.com.br

    • Publicações74
    • Seguidores49
    Detalhes da publicação
    • Tipo do documentoNotícia
    • Visualizações227
    De onde vêm as informações do Jusbrasil?
    Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/a-empregabilidade-seletiva-impoe-qualificacao-obreira-ao-cumprimento-das-metas-estabelecidas/2331340

    Informações relacionadas

    Fátima Silva Alcântara, Advogado
    Modeloshá 4 anos

    Reclamação Trabalhista(Rescisão Indireta - Assédio Moral)

    Petição Inicial - TRT18 - Ação Reclamação Trabalhista - Rescisão Indireta - Atord

    Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região
    Jurisprudênciahá 4 anos

    Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região TRT-2: XXXXX-75.2019.5.02.0058 SP

    Cairo Cardoso Garcia- Adv, Advogado
    Modeloshá 2 anos

    Alegações Finais- Trabalhista

    Petição Inicial - TRT12 - Ação de Rescisão Indireta de Contrato de Trabalho c/c Indenização por Danos Morais - Atord - contra PK Cables do Brasil Industria e Comercio

    0 Comentários

    Faça um comentário construtivo para esse documento.

    Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)